Por Roger Cunha
Na Universidade Estadual do Piauí (UESPI), um projeto de extensão tem chamado atenção ao propor uma discussão essencial para os rumos do Direito no século XXI: o impacto da Inteligência Artificial na prática jurídica. Coordenado pelo professor Ítalo José, o projeto “Direito e Inteligência Artificial” se apresenta como um espaço acadêmico e prático para refletir sobre as transformações tecnológicas que já começam a redesenhar o sistema de Justiça.

Projeto de Extensão em Direito e Inteligência Artificial forma profissionais para novos desafios jurídicos
A proposta não é apenas estudar a tecnologia, mas compreender como a IA está moldando — e será moldada — pelo Direito. “O projeto é uma ponte entre sala de aula, pesquisa de ponta e as demandas da sociedade. Buscamos promover um diálogo crítico, interdisciplinar e responsável sobre o uso da IA na área jurídica”, explica o professor Ítalo.
A ideia nasceu da percepção de uma lacuna: apesar da crescente presença da IA em tribunais, escritórios de advocacia e órgãos públicos, a formação jurídica ainda carece de uma abordagem que prepare os estudantes para esse novo cenário. “Notícias sobre algoritmos sendo usados em decisões judiciais, automação de tarefas jurídicas e até questões éticas sobre vieses algorítmicos nos fizeram perceber que não basta reagir. É preciso se antecipar, compreender e influenciar positivamente esse processo”, acrescenta o coordenador.
Entre os principais objetivos da iniciativa estão o aprofundamento do conhecimento sobre os aspectos legais, éticos e sociais da IA; a capacitação de estudantes e da comunidade jurídica; o fomento ao debate público sobre temas emergentes como responsabilidade civil de algoritmos, proteção de dados e regulação; além da promoção da produção científica e do diálogo entre universidade e sociedade.
As atividades do projeto são diversas: grupos de estudo, oficinas práticas, seminários com especialistas, produção de conteúdos para redes sociais, análise de casos concretos e acompanhamento de legislações nacionais e internacionais. Os encontros presenciais acontecem toda quinta-feira, às 17h30, no campus Torquato Neto, em Teresina, e já há planos para expandir as ações também para o formato híbrido.
Os estudantes participantes já sentem o impacto da experiência. O aluno Rikelme Oliveira diz que está motivado pela oportunidade de explorar novas experiências dentro da vida acadêmica. “Quando o professor falou sobre o projeto de extensão, me animei logo. É uma chance de fazer algo diferente, que também agrega muito ao currículo”, afirma.
Ele também reflete sobre o futuro da profissão jurídica diante da presença crescente da IA: “Ela já está sendo muito utilizada para otimizar o trabalho de advogados, revisar documentos, analisar contratos. Isso facilita, mas também pode reduzir oportunidades de emprego. Um advogado pode preferir contratar uma IA para fazer certos serviços em vez de outro profissional.”
Apesar das incertezas, ele reconhece o valor social do projeto: “Tem impactos positivos, como a orientação jurídica e o apoio ao trabalho do advogado. Mas também vejo que pode agravar a saturação do curso de Direito, algo que já preocupa muitos alunos”.
Outro participante, Felipe Baruc, revela que ingressou no projeto por querer compreender melhor como o Direito está lidando com as tecnologias emergentes. “Quis entender como essa relação acontece hoje e o que esperar no futuro. A IA deve ser vista como uma ferramenta, não como substituta. E isso exige preparo, tanto dos profissionais quanto do próprio sistema jurídico”, afirma.
O aluno também destaca o crescimento dos sistemas autônomos e as tentativas atuais de regulação como pontos de atenção. Para ele, o projeto também pode contribuir diretamente com a sociedade: “Muitas pessoas têm dúvidas sobre como essa tecnologia funciona na área jurídica. A universidade tem um papel importante em esclarecer isso”.
Para o professor Ítalo José, os desafios de integrar Direito e tecnologia são grandes. Ele aponta a diferença entre o ritmo acelerado da inovação e a lentidão natural dos processos jurídicos como um dos principais obstáculos. “A tecnologia muda muito rápido, enquanto o Direito precisa de tempo para amadurecer normas. Regular sem engessar é um equilíbrio difícil”.
Outro desafio está na comunicação entre juristas e desenvolvedores. “São áreas que falam línguas diferentes. É preciso construir pontes de entendimento. O jurista precisa entender como a tecnologia funciona, e o desenvolvedor precisa compreender os princípios jurídicos e éticos que regem a sociedade”, afirma.
O projeto, no entanto, não se limita ao campo teórico. As oficinas, simulações de casos e análises de ferramentas digitais proporcionam uma vivência prática aos estudantes. Eles saem mais preparados para atuar em um mercado de trabalho em transformação e com uma visão ampliada do papel do Direito em uma sociedade cada vez mais digital.
Aqueles que desejarem acompanhar ou participar do projeto podem entrar em contato pelo e-mail institucional do coordenador (italojose@ccsa.uespi.br). Os eventos abertos ao público também são uma porta de entrada para profissionais e pesquisadores interessados na temática.
“A construção do futuro do Direito na era digital é uma tarefa coletiva. Precisamos pensar esse futuro juntos, com responsabilidade, senso crítico e abertura ao novo”, conclui o professor Ítalo.